quarta-feira, 12 de dezembro de 2012

LA CUCARACHA





parecia ser apenas uma barata como qualquer barata que se vê por  aí mas na verdade era uma barata distinta e especial que parecia mexer as anteninhas quando algo lhe agradava e além disso parecia gostar de música se é que é possível uma barata gostar de música pois quando ouvia o som das cordas do meu bandolim  se aproximava  e eu que não tinha medo de baratas continuava a tocar enquanto ela mexia suas anteninhas suavemente como se fossem minúsculas perninhas de uma bailarina a dançar e não parava enquanto eu tocasse o que começou a me fazer vaidoso por ter uma platéia cativa tão atenta e participativa logo na fila do gargarejo o que me fez acostumar-me a toda manhã esperar pela minha companheira de audição e para ela tocar por horas até acontecer um fato inusitado  quando comecei a tocar certa manhã e nada dela aparecer  o que  me deixou consternado e a partir desse dia tal fato se repetiu o que me fez temer pela ausência daquela que fez meus dias se tornarem mais felizes  e que tanto contribuía para o aperfeiçoamento de minha arte e assim sendo resolvi dar uma busca pela casa para ver se a encontrava quando meus olhos subitamente pousaram em seu corpinho estendido no chão do banheiro de empregada com as patinhas para cima e eu  não querendo acreditar  me abaixei e soprei de levinho para ver se ela esboçava alguma reação mas suas anteninhas bailarinas permaneceram  imóveis o que me fez compreender que havia perdido minha companheira e em sua homenagem peguei meu bandolim e para seu corpo inerte toquei uma triste canção de despedida 


Ianê Mello


(09.12.12)

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Pintura de Pablo Picasso


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